Poema "Almas perfumadas"

29/09/2014 09:16

ALMAS PERFUMADAS

(Carlos Drummond de Andrade)

 

Tem gente que tem cheiro

De passarinho quando canta,

De sol quando acorda, de flor quando ri.

 

Ao lado delas,

A gente se sente no balanço de uma rede

Que dança gostoso numa tarde grande,

Sem relógio e sem agenda.

 

Ao lado delas,

A gente se sente comendo pipoca na praça,

Lambuzando o queixo de sorvete,

Melando os dedos com algodão doce

Da cor mais doce que tem pra escolher.

 

O tempo é outro.

E a vida fica com cara que ela tem de verdade,

Mas que a gente desaprende a ver.

 

Tem gente que tem cheiro

De colo de Deus,

De banho de mar

Quando a água é quente e o céu é azul.

 

Ao lado delas,

A gente sabe que os anjos existem

E que alguns são invisíveis

 

Ao lado delas,

A gente se sente chegando em cada e trocando o salto pelo chinelo,

Sonhando a maior tolice do mundo

Com o gozo de quem não liga para isso.

 

 

Ao lado delas,

Pode ser abril,

Mas parece manhã de Natal,

Do tempo em que a gente acordava

E encontrava o presente do Papai Noel.

 

 

Tem gente que tem cheiro

Das estrelas que Deus acendeu no céu

E daquelas que conseguimos acender na terra.

 

 

Ao lado delas,

A gente não acha que o amor é possível,

A gente tem certeza.

 

 

Ao lado delas,

Saboreamos a delícia do toque suave

Que sua presença sopra no nosso coração

 

 

Tem gente que tem cheiro,

De cafuné sem pressa,

Do brinquedo que a gente não largava,

Do acalanto que o silencio canta,

Do passeio pelo jardim.

 

 

Ao lado delas, a gente lembra que no instante em que rimos

Deus está conosco, juntinho, ao nosso lado.

E a gente ri grande que nem menino arteiro.

 

 

Tem gente como você,

Que nem percebe como tem a alma perfumada

E que esse perfume é dom de Deus.

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